O Museu Mestre Batista vai ser inaugurado na sexta-feira, 30 de maio, às 18h30, dia em que se assinala o 74º aniversário do nascimento do histórico cavaleiro tauromáquico. O museu vai acolher o espólio mais relevante de José Mestre Batista (1940-1985), cedido pela família do toureiro, nomeadamente pela sua viúva, Tina Mestre Batista, e estará aberto ao público de terça-feira a domingo, das 10h às 13h e entre as 15h e as 19h.
No Museu Mestre Batista vão estar em exposição 23 casacas, um fato curto completo, várias jaquetas, quatro fatos de tourear (trajo de Luzes) dos bandarilheiros, a cabeça, a crina e uma pata do cavalo Falcão, quatro selas de tourear e dois selins à inglesa, vários arreios de cortesia, freios e estribos. Os visitantes poderão também ver alguns objetos pessoais do toureiro, como relógios de bolso com corrente em prata, fio com crucifixo em prata, botões de punho em prata, aliança de casamento e devido livrinho de Pádua, livro de orações com capa em madre pérola, óculos de ler, troféus e as insígnias do grau de Comendador da Ordem do Infante Dom Henrique, atribuído a título póstumo pelo Presidente da República, Ramalho Eanes, em 1985.
Na cerimónia de inauguração do museu, a CARMIM – Cooperativa Agrícola de Reguengos de Monsaraz, vai lançar uma edição especial do vinho Reguengos Reserva, em homenagem a Mestre Batista. Foram produzidas cinco mil garrafas de vinho tinto e igual número de vinho branco que serão vendidas na CARMIM a 3,99 euros a unidade.
O Museu Mestre Batista foi criado pelo Município de Reguengos de Monsaraz nas antigas instalações da Biblioteca Municipal, após a realização de obras de requalificação do edifício. Em 2009 José Mestre Batista foi homenageado pela Junta de Freguesia de São Marcos do Campo com a inauguração de uma estátua equestre na rotunda de entrada da aldeia e dois anos depois pela Santa Casa da Misericórdia de Reguengos de Monsaraz com a atribuição do seu nome à praça de touros de Reguengos de Monsaraz.
“Guardei todo o espólio durante quase três décadas para que um dia a sua memória fosse perpetuada num museu como o toureiro que foi e como homem”, revela Tina Mestre Batista. “Quero por isso manifestar a minha felicidade por o espólio ficar condignamente neste museu e por ser no seu concelho natal”.
José Calixto, Presidente da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, afirma que “este é um museu feito com sentimento. É um museu que homenageia uma figura ímpar da tauromaquia, respeitada e adorada no concelho onde nasceu e que o viu tourear em tantas tardes de glória”. O autarca refere que “após várias homenagens feitas no concelho e em diversos locais do país, Mestre Batista merece agora o reconhecimento da autarquia com a criação do seu museu, onde todos os aficionados poderão apreciar o seu espólio profissional e pessoal”.
Texto de Tina Mestre Batista sobre José Mestre Batista
“Toureiro de corpo inteiro que, praticamente sem ajudas de ninguém se fez a si próprio tornando-se num ídolo e marcando uma época”
Filho de José Batista Pereira e Maria Júlia Mestre, Tita, como era conhecido e apelidado pelos familiares e amigos, nasceu a 30 de maio de 1940 no Monte do Bonical, freguesia de São Marcos do Campo e concelho de Reguengos de Monsaraz. Demonstrou desde criança o grande desejo de vir a ser cavaleiro e começou por montar um burro com o qual fazia as maiores traquinices, desde simular faenas até subir as escadas da igreja.
Depois da instrução primária tirada em São Marcos do Campo, passou a frequentar um colégio em Évora, donde as fugas eram constantes pois a sua vontade de prosseguir os estudos era nula. Os cavalos eram o seu fascínio. Regressou então a São Marcos do Campo para ajudar na lavoura e aos doze anos teve a primeira montada, o Ideal, cavalo com o ferro de seu pai e com o qual começou a tourear apenas baseado na sua intuição e talento natural, visto não ter frequentado qualquer escola de equitação nem ter na família tradições equestres.
Um ano mais tarde (1953), aos treze anos, fez a sua primeira atuação, estreando-se na Praça de Touros de Mourão, nas Festas de Nossa Senhora das Candeias. Esteve presente Luís Gonzaga Ribeiro, natural de Reguengos de Monsaraz, o homem que lançaria Mestre Batista no panorama tauromáquico, tornando-se seu apoderado, amigo e protetor. Luís Gonzaga Ribeiro levou-o para o Beco dos Beguinhos, em Lisboa, deixando-o aos cuidados de sua mãe, D. Alice Fusco, para começar a frequentar a escola de equitação de Mestre Nuno de Oliveira. Mas o sonho continuava o mesmo, não queria ser equitador, queria ser toureiro.
Ao fim de quatro anos como amador, Mestre Batista recebe a alternativa de cavaleiro tauromáquico profissional, a 15 de setembro de 1958, na Praça de Touros Daniel de Nascimento, na Moita, depois de lhe ter sido recusada três meses antes, a 19 de julho, na Praça de Touros do Campo Pequeno, em Lisboa (a única alternativa recusada em toda a história do toureio a cavalo). Aprovada, desta vez por unanimidade, o cavaleiro teve como padrinho D. Francisco Mascarenhas. A sua primeira corrida como profissional foi na Chamusca, em outubro, saindo triunfador e tendo feito a estreia do cavalo Forcado.
Apesar de muito criticado e apelidado por alguns de louco, devido ao arriscado e frontal toureio que praticava, depressa passou a alternar com cavaleiros de primeira categoria. Aos poucos o público começou a render-se ao seu novo modo de tourear, assistindo-se a uma verdadeira revolução no toureio a cavalo.
Arrastando multidões, pisando terrenos até então proibidos que culminavam com os famosos “Ferros à Batista”, instituiu um estilo próprio que veio influenciar a maioria dos cavaleiros das gerações posteriores. A 10 de junho de 1962, em Santarém, realizou uma magnífica atuação e Mestre Batista deu cinco voltas à arena com saída em ombros.
Além do seu estilo de tourear incomparável, a revolução no toureio a cavalo passou pela alteração no vestuário, tendo adaptado o uso de casacas mais curtas, leves e ligeiramente cintadas, calções brancos e sem meias a tapar os joelhos. Conservou contudo o uso do tricórnio durante toda a lide.
Alternou em centenas de corridas de touros com Luís Miguel da Veiga que, apesar de sincero amigo, era considerado seu rival pelo público. Com lotação esgotada, os dois formaram o cartel mais anunciado, disputado e discutido durante quinze anos, fazendo aumentar o interesse pelo toureio a cavalo e trazendo milhares de aficionados para a corrida à portuguesa. Ficaram também célebres as corridas com o rejoneador Álvaro Domecq com touros em pontas na Praça de Touros do Campo Pequeno, as corridas dos três “Zés” com José Lupi, José Núncio e José Mestre Batista e os duos com José João Zoio.
Por três vezes (1963, 1964 e 1971) lhe foi atribuído o prémio Bordalo na categoria de tauromaquia como melhor cavaleiro. Para além de Portugal continental, Mestre Batista toureou nos Açores, Luanda, Lourenço Marques, Macau, Espanha e França. Apesar do sucesso que o acompanhou, nunca impôs nomes de ganadarias de touros, nunca exigiu ou recusou alternar com qualquer cavaleiro, toureou em dezenas de festivais e corridas de beneficência e demonstrou sempre extrema sensibilidade aos problemas dos mais necessitados.
Durante a sua carreira recebeu e guardou mais de 5000 cartas de fãs, algumas endereçadas apenas a “José Mestre Batista, Portugal”.
Dos momentos menos bons destacam-se as colhidas graves nas praças de touros de Santarém, Espinho, Almeirim e Vila Viçosa e o facto de a 26 de novembro de 1967, devido às inundações, ter perdido alguns dos seus melhores cavalos, entre eles o Tirol e o Talismã.
Nessa altura mudou-se para uma quinta em Alhandra e dedicou-se arduamente à seleção e treino de novas montadas, como o Trovador e Kalinka (ferro José Assis Palha), Apolo XI (ferro Tomás da Costa) e Satélite (ferro Vidal), o cavalo que mais touros toureou na quadra de José Mestre Batista. Nos últimos anos de toureio destacaram-se cavalos de qualidade como Dragão, Chacal, Concorde, Kruft e Zurbaran.
Como a maioria dos cavaleiros era um homem de fé e a sua imagem de devoção a Nossa Senhora D’ Aires. Na sua igreja, em Viana do Alentejo, cuja abóbada e altar mandou restaurar, frequentemente mandava depositar as flores recebidas nas corridas.
Casou em casa do seu apoderado Inácio Saraiva, em Lisboa, às 16 horas do dia 9 de outubro de 1973, pelo civil, com Emeletina Maria de Lima Duarte Boiça e toureou à noite a corrida da feira de Vila Franca de Xira, sem que ninguém soubesse, inclusive os seus bandarilheiros, que era um homem casado. A 31 de dezembro do mesmo ano celebrou o casamento religioso na Basílica de Santo António, em Pádua, Itália. No dia 22 de julho de 1975 nasce o seu único filho, João Miguel Duarte Boiça Mestre Batista, sendo batizado na sua querida igreja de Nossa Senhora D’ Aires.
José Mestre Batista faleceu de um ataque de asma, seguido de paragem cardíaca, a 17 de fevereiro de 1985, em Zafra, Espanha, na companhia de sua mulher e filho, e as suas últimas palavras foram “Valha-me Nossa Senhora D’Aires”. Repousa no cemitério de Vila Franca de Xira em mausoléu.
Foi condecorado a título póstumo pelo Sr. Presidente da República General Ramalho Eanes, com a Ordem do Infante D. Henrique.
No decorrer destes 28 anos foram muitas as homenagens e exposições organizadas para relembrar o seu nome. Na sua terra natal, São Marcos do Campo, em julho de 2009 a Junta de Freguesia do Campo inaugurou uma estátua equestre na rotunda da entrada da aldeia.
Em junho de 2011 a Santa Casa da Misericórdia de Reguengos de Monsaraz atribuiu à praça de touros de Reguengos de Monsaraz o seu nome, colocando um painel de azulejos oferecido por António Garçoa, seu fiel peão de brega.
Emeletina Mestre Batista
Bibliografia consultada:
Rui Laureano – Morreu José Mestre Batista (Jornal Palavra 1985)
António Garçoa – Mestre Batista, toureiro de uma época 1995
Manuel Bulhosa – Um século de toureio equestre em Portugal 1996
Susana Laureano Cardoso – Vidas com valor 2010