Joaquim Ferreira da Silva – “O Ardina” foi o convidado da Biblioteca Municipal para a atividade Artes & Ofícios que, na passada quarta-feira, 23 de janeiro, decorreu na Sala Infanto-Juvenil.
Participaram cerca de 50 crianças, duas turmas do 4º ano do 1º ciclo, uma da Escola dos Sininhos e outra da Escola Nova, que receberam o protagonista com um pregão bem-sonante: “Olh’à Bola! Olha o Comércio! Olh’ó Notícias! Olha o Janeiro!”, fazendo-o regressar ao passado.
Breve história da vida d’O Ardina:
Foi a súbita e prolongada doença do pai, “António dos jornais” – o ardina lendário do comboio “Póvoa-Porto-Póvoa”, ao longo de mais de 50 anos – mudou o curso da vida do Joaquim, aos 17 anos: a necessidade de começar a trabalhar para ajudar no sustento da casa inviabilizou, definitivamente, a projetada formatura de “professor primário”, e passou a ajudar o pai na venda dos jornais – tarefa que já antes vinha executando aos domingos, a par da irmã mais velha, a principal auxiliar do pai António, ao longo dos anos.
Nos restantes dias da semana rumava ao Porto – portador do “passe de circulação gratuita no comboio”, fornecido pelo jornal “Diário da Manhã”, à semelhança de outros jornais que distribuíam os seus “passes” pelos diversos ardinas.
Durante o percurso, vendia alguns jornais e revistas até à estação da Trindade, onde “despia” a farda de ardina e seguia para o escritório do seu patrono, Orlando Gonçalves Lima, onde se iniciou como escriturário, a par do Curso de Dactilografia da “Escola Maratona”.
Seguiu-se nova mudança da agulha na “linha da vida” motivada pelo fecho do escritório, porém, desta feita, para melhor: em 1958, completados os 18 anos de idade, e após um estágio – não remunerado – foi admitido nos Serviços Municipalizados da Câmara da Póvoa de Varzim, como escriturário – interino (a ocupar a vaga do funcionário a cumprir o Serviço Militar), quiçá sobremaneira ajudado pelo diploma trazido da prestigiada “Escola Maratona” e com o beneplácito de alguns Amigos do pai, bem posicionados.
Veio o Serviço Militar – ao longo de intermináveis quarenta e sete meses, parte em quartéis do Continente, e a outra na estúpida guerra de Angola.
Em 1964, regressado – salvo, mas marcado para o resto da vida…, casou, despediu-se da Função Pública, e voltou a África – Moçambique – acompanhado da esposa, com familiares na bonita capital, então, Lourenço Marques, onde se manteve até ao ano de 1973, em diversas ocupações: escriturário, guarda-livros, gestor de empresas, e bancário. Uma vez mais, de volta ao Continente, acabou por se reformar, bancário.
A par da atividade profissional, manteve intensiva vida desportiva, na qualidade de praticante, dirigente e treinador, em ténis de mesa, futebol, voleibol e atletismo, ao longo de sessenta anos, no desporto “por desporto”.
Joaquim Ferreira da Silva também destacou a vertente cultural que tem vindo a desenvolver através de publicações – prosa e poesia – nos jornais da Póvoa, desde os anos 70, e assíduo aprendiz das “Correntes d`Escritas”, que habitualmente saúda com a publicação de um curto poema.
Sobremaneira motivado, conseguiu realizar um sonho antigo: escrever e publicar um livro, “O ARDINA, o livro sonhado…”, apresentado em finais de 2006, que dedicou aos ARDINAS DE PORTUGAL, em homenagem ao pai, António – o seu herói! sentida dádiva de gratidão (sem esquecer a mãe Amélia – qual heroína, ao longo de uma vida dura, em mar de lágrimas…).
Ainda houve tempo para recordar outros nomes dos ardinas poveiros do seu tempo e, a terminar, deixou-nos os nomes dos principais jornais diários da época – anos 50.
O ardina vendia jornais na rua e começaram por ser crianças – tal como o Joaquim, com a maioria mal vestida e descalça, mas muito despachada e sempre de olho vivo e a entregar ao domicílio em intensivo porta a porta.
Os ardinas deslocavam-se às Secções de Vendas das Redações para adquirir os jornais, a pronto pagamento ou a crédito. A partir dos anos 40, as empresas jornalísticas começaram a ter vendedores nas estações, fardados e usavam um boné com o nome do jornal, percorrendo os comboios.
Em meados do século XX os jornais começaram a ser vendidos em locais fixos, nos quiosques, em bancas e nas papelarias, acabando por extinguir a profissão de ARDINA – a atingir, também, o “António dos jornais”, que conseguiu sobreviver, e manter o sustento da família, graças à ocupação de “cauteleiro” na venda da lotaria e de “recoveiro” entre a Póvoa e o Porto, que sempre manteve a par da principal profissão de ardina.
Por último, uma pergunta se impunha! Porque chamavam de ardina ao vendedor de jornais? O Joaquim, deveras surpreendido, e após curta meditação, rematou “Oh! Já soube, mas esqueci…”.
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