Mário Lúcio Sousa esteve na Póvoa de Varzim, na passada sexta-feira à noite, para a apresentação do seu mais recente romance O Novíssimo Testamento.
A obra, que já lhe valeu o Prémio Literário Carlos de Oliveira em 2009, denota uma notável capacidade de efabulação do autor bem como a utilização de uma linguagem vasta e rica numa abordagem original do religioso: dá testemunho da reencarnação de Jesus no corpo de uma mulher – ilhéu e africana – que parece ter vindo inaugurar a Terceira Idade do Mundo, mas não está livre de enfrentar os preconceitos sociais, religiosos e políticos do seu tempo.
A propósito deste seu livro, Mário Lúcio afirmou que a religiosidade envolve elementos de uma dimensão cósmica, assumindo que a ficção de Jesus ser uma mulher muda a perspectiva do mundo. O autor considera que a Igreja católica apaga a presença da mulher e chama a atenção para o facto de na Bíblia Jesus nunca ser referido como Filho da Mãe mas sempre como Filho do Pai.
O escritor cabo verdiano referiu que pela diferença da apreensão de Deus já se matou mas para ele a diversidade de Deus é muito importante: “é necessário cada um ver à sua maneira”. Sendo Deus aquilo que defendemos ele não pode render-se a um género – masculino, disse Mário Lúcio. Vivemos numa época em que as mulheres continuam a ser apedrejadas e mutiladas e a única coisa que podemos fazer é colocar uma mulher na posição de Jesus, enunciou. O autor expressou ainda que antigamente, os homens e as nações lutavam por bens materiais e actualmente matam-se por terem visões diferentes de Deus. “No passar do milénio, vivemos coisas muito conturbadas e o meu sonho é que a violência seja encarada como algo ridículo”, manifestou.
Perante as ideias expressas por Mário Lúcio, Luís Diamantino, Vereador do Pelouro da Cultura, disse que o livro O Novíssimo Testamento lhe suscitou a curiosidade, referindo que às vezes a realidade é mais ficcional do que a própria ficção. O Vereador não pôde deixar de concordar com Mário Lúcio no facto de Jesus, Filho de Maria, ser sempre apontado como Filho de Deus. “Isto faz-nos pensar”, afirmou, reconhecendo que a Igreja é uma organização que baniu as mulheres, tendo em conta que os padres são homens e não podem ser mulheres. Luís Diamantino aludiu ainda à importância das diferenças e diversidade: “a nossa razão é apenas uma razão assim como a nossa verdade é apenas uma verdade”, concluiu.
Estiveram também presentes Maria do Rosário Pedreira, em representação da D. Quixote e enquanto impulsionadora da publicação da obra, e Manuel Jorge Marmelo que fez a apresentação de O Novíssimo Testamento, a propósito do qual referiu “está condenado a ser uma obra-prima da literatura de Cabo Verde”.
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